quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

A Copa de 2022

 

Essa Copa do Mundo tem tanta coisa para falar que não consigo parar de escrever, mas resolvi publicar e depois, na medida que a gente for lembrando, vamos publicando por aqui.


 


 
No dia 20 de novembro, iniciava no Catar a vigésima segunda edição da Copa do Mundo de Futebol, realizada pela primeira vez entre os meses de novembro e dezembro devido às altas temperaturas que o país sofre no meio do ano. 32 seleções, de cinco continentes diferentes, disputaram 64 partidas no total, em 07 cidades-sede, no Catar, continente Asiático, a primeira no mundo Árabe. Com as atenções voltadas para a Copa do Mundo, as “cortinas” das luxuosas construções que compõem o território não foram suficientes para esconder as violações de direitos humanos que ocorrem no país. A Copa da ostentação e cheias de luxo, mas também das desigualdades e da opressão a segmentos da sociedade. Diversas denúncias vêm sendo realizadas pela comunidade internacional desde antes da abertura da competição e esta Copa estará marcada pelas violações dos direitos humanos que vão desde a exploração dos trabalhadores que construíram as infraestruturas dos estádios, discriminação das mulheres e pessoas LGBTQIA+ e a falta de liberdade de imprensa e também dos jogadores das seleções e dos torcedores que não puderam se posicionar politicamente. Sobrou até para a nossa bandeira de Pernambuco, que foi confundida com a bandeira LGBTQIA+ só porque também conta com um arco-íris.


É jogo de Copa



No dia 22 de novembro, em partida válida pela 1ª rodada do grupo C, a Argentina perdeu para a Árabia Saudita sua única partida da Copa, após ter feito um ótimo ciclo de Copa do Mundo, ter vencido a última Copa América em 2021, contra o Brasil, e a Finalíssima em 2022 contra a campeã da Eurocopa, Itália. Perdeu quando ainda dava para perder. A partida terminou 2x1 para os Sauditas em uma virada histórica, mas não venceram mais nenhuma partida na Copa. Nas rodadas seguintes, perderam para a Polônia por 2x0 e para o México por 2x1, despedindo-se do torneio ainda na primeira fase. No Grupo C, classificaram Argentina e Polônia.


No grupo E, as apostas apontavam para a tetra campeã mundial Alemanha e na campeã mundial Espanha e que Japão e Costa Rica eram apenas figurantes. Mas não foi bem assim que aconteceu. Logo na primeira rodada o Japão venceu a Alemanha e a Espanha confirmou o favoritismo contra a Costa Rica. Com os resultados, a Alemanha já poderia ficar de fora logo na segunda rodada, mas a Costa Rica, que havia sido goleada pela Espanha, ganhou do Japão e a Espanha empatou com a Alemanha o que deixou as vagas abertas para a última rodada, que reservou fortes emoções. O Japão venceu a Espanha e garantiu o primeiro lugar do grupo, no outro jogo a Costa Rica chegou a engrossar contra Alemanha em um determinado momento do jogo e quase garantiu a segunda vaga. A Alemanha acabou vencendo o jogo, mas não a classificação. No Grupo E a Espanha ficou com o segundo lugar por conta do saldo de gols.


A seleção que encarou cada partida como jogo de Copa do Mundo foi a Seleção do Marrocos e fez história terminando a competição na quarta colocação. A equipe passou em primeiro lugar no grupo F com Croácia, Bélgica e Canadá. Em seguida, nas oitavas de final, o país enfrentou a Espanha e venceu nos pênaltis após empate em 0 a 0. Nas quartas de final, Marrocos venceu a seleção de Portugal por 1x0 e passou a ser a primeira equipe do continente africano a chegar em uma semifinal de Copa do Mundo. Na sequência, após um jogo duro contra a França, o sonho da final foi interrompido. A seleção francesa venceu a partida por 2x0.



As Coincidências


Uma série de coincidências entrelaçaram os elos entre a Copa do Mundo de 2002 e de 2022, as forças do universo estavam atuando para que as pontas soltas se juntassem em uma sincronicidade de acontecimentos semelhantes entre os dois mundiais de seleções, que nos traziam confiança ao lembrarmos que há 20 anos atrás o Brasil conquistou o Pentacampeonato mundial.


A primeira coincidência que podemos apontar é o fato de que a última seleção campeã, antes das Copas de 2002 e 2022, foi a seleção francesa, que venceu em 2018, na Copa do Mundo da Rússia, e também tinha sido campeã em 1998, comemorando o título em casa, na própria França.


Outra semelhança que podemos apontar entre as duas copas do mundo é a que ambas trouxeram o continente asiático como sede dos jogos. Em 2002 as partidas foram disputadas em cidades do Japão e da Coreia do Sul, já em 2022 o Catar recebeu os jogos das principais seleções do mundo no campeonato mundial.


Trazendo para o futebol local, aqui em Pernambuco, uma outra coincidência entre 2002 e 2022, foi o triunfo do Clube Náutico Capibaribe, que comemorou o Bicampeonato pernambucano no mesmo ano da Copa. Fato que aconteceu em 2002 e também em 2022. Escutei de um próprio torcedor alvirrubro que essa talvez fosse a coincidência mais difícil de acontecer, tendo em vista as poucas alegrias e conquistas que o clube lhe deu nos últimos 20 anos.

Para aumentar ainda mais a confiança de quem gosta de uns sinais trazidos pelas coincidências, uma outra semelhança que podemos identificar entre 2002 e 2022 é na política brasileira. Em 2002, Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito presidente do Brasil pela primeira vez para fazer história no país. Em 2022, Luiz Inácio Lula da Silva também foi eleito presidente do Brasil pela terceira vez, depois de uma das eleições mais acirradas da história do país.


Todas essas coincidências entre 2002 e 2022 nos deixavam acreditar serem verdadeiros sinais de que o hexa campeonato estava próximo. Mas, apesar das semelhanças, não foi o Brasil que soltou o grito entalado na garganta de é campeão no final do campeonato. Afinal, cada copa tem a sua história e personagens e é isso que a torna tão encantadora.


Os brasileiros apontaram que seria pedir demais aos Deuses uma vitória da seleção brasileira da Copa do Mundo logo depois de uma eleição presidencial histórica no país que colocou fim a um governo fascista e devastador com a derrota de Jair Bolsonaro, e que trouxe de volta a esperança de dias melhores com o presidente Lula eleito novamente. “Sorte na política e azar no jogo e também no amor que cultivamos pelo futebol”, descreveu Dona Duda, vendedora de cafezinho da Estação de Metrô Joana Bezerra, no Recife-PE.



O Resgate


No dia 24 de novembro, o Brasil entrou em campo para resgatar o orgulho do povo brasileiro que voltava aos poucos a erguer a bandeira do país e a vestir a camisa da seleção sem medo de ser confundido como eleitor do presidente fascista e destruidor, Jair Bolsonaro, que havia perdido as eleições presidenciais no dia 30 de outubro. Quando o Brasil entrou em campo, muitos apoiadores do candidato derrotado ainda estavam fazendo atos antidemocráticos, se opondo ao regime democrático de direito, fechando as estradas brasileiras e contestando as urnas que garantiram a vitória democrática para o presidente Lula. Ainda ousavam gritar aos ventos na frente dos quartéis por intervenção militar. Por isso, ninguém com consciência queria ser confundido com essas pessoas idiotas. Mas era a seleção em campo e esse símbolo nacional precisava ser resgatado pelas pessoas brasileiras, e às 16h00, horário de Brasília, a bola rolou para Brasil e Sérvia, em Lusail.


Foi bonito assistir o futebol arte brasileiro voltar com tudo logo na estreia. A seleção brasileira jogou leve e com muita vontade de ganhar a Copa. Deu para ver logo no primeiro jogo que vontade não ia faltar. Mas dava para ver também um outro adversário forte para os brasileiros, a afobação. A vontade de ganhar não poderia se misturar com a afobação. Seria preciso colocar a bola no chão, ter tranquilidade, calma, paciência e ficar atento e forte, pois qualidade já tínhamos identificado no início da competição.

O treinador Tite escalou o time pra frente, ofensivo, e controlou o jogo do começo ao fim com muita intensidade e venceu a Sérvia pelo placar de 2x0. Com direito ao gol eleito como mais bonito da Copa, “o Voo do Pombo”.


O Voo do Pombo





O “Voo do Pombo” foi uma verdadeira obra de arte, uma coisa linda de orgulhar qualquer brasileiro amante do futebol. O gol foi a assinatura da volta do futebol arte do Brasil. Dançado pelos movimentos ritmados composto pelo passe de Vinícius Júnior e o movimento expressivo do corpo que eternizou o golaço de bicicleta do centroavante Richarlison. O jogador ficou conhecido em todo o mundo como "Pombo", apelido que ganhou em 2018, jogando pelo futebol inglês. Daí o nome da obra de arte "O Voo do Pombo”. O gol do artista nos devolveu o orgulho de ser brasileiro. A partir dali, o Brasil só precisava se divertir com a bola, e isso a gente sabe fazer. A Alegria contagiou todo mundo com jogos e danças encantadoras. Apenas alguns que costumam ser contra as alegrias, principalmente as alegrias das pessoas que estão ao Sul do mundo, “Como podem ser alegres desse jeito esses seres que habitam o sul do mundo, é proibido alegria em campo”, apontavam os inimigos da felicidade.

Mas a alegria é a nossa maior identidade no futebol e ela tinha voltado com tudo e foi possível assistir outros momentos do jogo bonito, artístico e encantador dançado pelos brasileiros.

No Catar, o Brasil também perdeu uma vez ainda na fase de grupos e com a seleção brasileira com o time reserva e já classificada, a derrota foi para a seleção de Camarões, do continente africano, que também traz a alegria como identidade. Também teve um empate com derrota nas penalidades para a pragmática Croácia. Depois de um golaço brasileiro com uma jogada coletiva composta de troca de passes envolventes e um toque artístico de Neymar que driblou o goleiro e chutou para o fundo das redes, não poderíamos jamais deixar a Croácia empatar. O doutor Sócrates Brasileiro dizia que o futebol por ser uma arte, e não uma competição, vale a beleza, pois, nessa arte, o feio pode superar o belo, e o time fraco pode até vencer, e vencer legalmente, às vezes por influência do acaso. Às vezes consegue um empate pragmático e vence nas penalidades, foi assim que a Croácia havia sido vice-campeã na copa do mundo de 2018 na Rússia e utilizou da mesma estratégia na Copa no Catar terminando a competição em terceiro lugar. Essa derrota nos pênaltis adiou o nosso momento de êxtase e o nosso grito de hexa campeão e vai ficar entalado na garganta até 2026. Mas mesmo na derrota, essa copa nos deu alegria de resgatar a nossa principal paixão, a seleção brasileira e o nosso futebol arte. 2026 é logo ali.


O Maior adversário do Brasil


Desde o primeiro jogo do Brasil na Copa do Mundo do Catar foi possível identificar o futebol arte dançado pelos jogadores que jogavam livres e ofensivamente para expressar suas emoções por meio dos movimentos ritmados e expressivos com a bola. Dançar exige uma preparação dos movimentos coreografados até mesmo para o improviso, principalmente quando é uma dança coletiva. O ato de dançar necessita da ativação de diversas atividades cognitivas como a atenção e concentração, memória, raciocínio lógico, noção espacial e consciência corporal. Desde o primeiro jogo identificamos que as atividades cognitivas como memórias, raciocínio lógico, noções espaciais e consciência corporal, estavam bem treinadas, a exemplo do gol obra de arte “O Voo do Pombo”, executado por Richarlison, assim como também o gol de Neymar nas quartas de finais que foi preciso muita noção espacial e raciocínio lógico dos jogadores para furar o bloqueio da Croácia. Mas desde a primeira partida também foi possível identificar o maior adversário do Brasil, a afobação. Muita pressa para marcar os gols e precipitação para finalizar as jogadas foram identificadas já no primeiro jogo. Muita afobação dos jogadores da seleção acabou atrapalhando dois pilares necessários para executar uma dança, a atenção e a concentração. No jogo contra a Croácia, no dia 09 de dezembro, o Brasil já ganhando de 1x0 continuou afobado para marcar mais um, prejudicando assim a atenção e a concentração dos jogadores que acabaram executando movimentos descompassados entre eles e deu espaço para, no contra ataque, a Croácia fazer o gol de empate e na sequência eliminar o Brasil nas penalidades. Não se pode deixar a afobação ganhar espaço. Faltou um pouquinho de experiência para segurar o resultado, faltavam só 4 minutinhos para o jogo terminar, não precisava se afobar, dava para evitar a Croácia empatar. Um outro apontamento que vai ecoar nos próximos anos é o de que não se pode colocar um jogador ainda jovem e na primeira experiência em Copa do Mundo para iniciar as cobranças de pênaltis, tinha que ser um jogador mais experiente, uma liderança do grupo, tinha que ser o Neymar o primeiro a cobrar.


Mas, 2026 é logo ali, e teremos tempo para que a seleção brasileira consiga se preparar fisicamente, taticamente e emocionalmente para dançar em campo, desta vez sem afobação, com tranquilidade, tendo paciência, jogando com consciência, atenção e concentração que o jogo de copa do mundo merece. Para que em 2026 o espetáculo de dança não termine em tragédia e que o final seja com felicidade.


A nova Tricampeã

 

No dia 18 de dezembro, as duas melhores seleções da competição entraram em campo para um jogo épico que valia o tricampeonato mundial para qualquer uma que ganhasse a final da Copa do Mundo no Catar. Argentina e França já haviam feito, na Arena Kazan, em 2018, o melhor jogo da Copa da Rússia. O encontro foi nas Oitavas de Final daquele ano e terminou 4x3 para os franceses em uma partida muito disputada e com viradas impressionantes. A França seguiu na competição e foi campeã mundial daquele ano. Quis os Deuses do futebol que dessa vez essas duas seleções se encontrassem na final do mundial para mais uma partida que vai ficar para história como uma das melhores finais de todos os tempos.


De um lado, jogando pela Argentina, o que joga futebol como os Deuses, o mago que dança e se diverte com a bola, a personificação do futebol arte mundial, vencedor de sete bolas de ouro do melhor jogador do mundo, “herdeiro” do trono mágico argentino deixado por Maradona, Leonel Messi, que chegava a sua quinta Copa do Mundo, segunda final de mundial, mas sem nenhum título.


Do outro, jogando pela França, o jovem artista, que esbanja criatividade, brinca com a bola com dribles, velocidade, beleza, harmonia e equilíbrio. Campeão da Copa do Mundo de 2018. O mais novo representante do futebol arte mundial, Mbappé, que chegava a sua segunda copa do mundo, segunda final e já com um mundial levantado em 2018.


Atualmente, ambos jogam pelo PSG, time francês, mas que conta com quantias financeiras consideráveis vindas do Catar. Com esses dois em campo, o placar não poderia passar em branco. Os dois chegaram na final disputando a artilharia e depois de boas atuações dentro de campo durante a competição. Tinha tudo para ser um grande jogo de futebol como já tinha ocorrido em 2018 e com a bola em campo as expectativas se confirmaram.


No primeiro tempo a Argentina bailou uma dança coletiva em cima dos franceses e dominou as ações fazendo 2x0, com gols de Messi e Di Maria. No segundo tempo, o jovem artista francês, Mbappé, que não vinha muito bem na partida, resolveu entrar em ação e marcou duas vezes, em dois minutos, empatando o jogo. O duelo continuou na prorrogação e Messi fez 3x2, mas Mbappé, de pênalti novamente, como tinha sido seu primeiro gol, fez o terceiro e empatou o jogo em 3x3. A nova seleção tricampeã foi definida nas penalidades e o título voltou para as mãos dos sul-americanos, que levaram a melhor por 4 a 2, com o goleiro Emiliano Martínez brilhando. Mbappé havia criticado o futebol sul-americano dizendo que não era tão avançado e quis os Deuses do Futebol que a taça de campeão do mundo retornasse ao território da América do Sul.


As mãos argentinas



Em 1986, no bicampeonato Argentino, a mão de Diego Maradona ficou eternizada na história do futebol por conta de um dos seus gols no jogo épico contra a Inglaterra. O seu gol é até hoje lembrado e louvado e que ficou conhecido como o gol da “La Mano de Dios”. Quis o destino que a mão de outro argentino fosse lembrada também no tricampeonato, mas não foi a mão do zagueiro Montiel que bateu com o braço na bola dentro de sua área após um chute de Mbappé possibilitando o pênalti que garantiu o empate da França nos minutos finais da prorrogação. A mão que será eternamente lembrada é a mão do goleiro argentino Emiliano Martínez, abençoada por Maradona lá do céu. Martínez, que já havia pego dois pênaltis contra a Holanda nas quartas de final, defendeu o chute de Coman, que ajudou os sul-americanos a conquistar o título da Copa do Mundo de 2022.


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A Felicidade


A terceira estrela tão esperada pelos argentinos finalmente saiu e o grito de tricampeão ganhou as ruas do país para celebrar. A conquista da Copa do Mundo foi também a coroação de Messi como o melhor jogador deste século até agora. Faltava a ele esse título para não restar dúvidas. O mundo dos amantes do futebol ficou feliz com a coroação de Messi por personificar a felicidade em forma de futebol arte. 


 

segunda-feira, 25 de março de 2019

[Frases nos Estádios de Futebol]

Recife, Ilha do Retiro, 24 de março de 2019, 10 minutos de bola rolando da partida entre Sport e Petrolina, a torcida Antifascista rubro-negra ergueu a faixa com a mensagem:


"Torcedor/a é trabalhador/a e também quer se aposentar"


Em seguida, a Polícia Militar de Pernambuco ordenou a retirada da faixa do estádio alegando que a mesma entrou de forma clandestina. A faixa foi devolvida no final da partida.

domingo, 17 de março de 2019

[Frases nos Estádios de Futebol]

No estádio dos Aflitos no Recife, Clássico das Emoções, dia 17 de março, última rodada da fase de grupos do campeonato pernambucano 2019. Dentro de campo o resultado final da partida foi Náutico 0 x 0 Santa Cruz. Mas nas arquibancadas a torcida alvirrubra fez um gol de placa. Um ano após a emboscada que matou a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes (o caso aconteceu no dia 14 de março de 2018 no Rio de Janeiro) a torcida do Náutico ergueu a faixa querendo saber:

"Quem mandou matar Marielle?"  

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

O futebol como bandeira política



Falar que “política e futebol não devem se misturar” está ganhando mais visibilidade atualmente, mas na verdade esses dois já estão juntos há muito tempo e não dá mais para ignorar. Ao longo dos anos, diversos movimentos surgidos no futebol focados na luta por liberdade de expressão e resistência se espalharam em vários lugares pelo mundo, assim também como o uso do futebol por governantes com fins de propaganda política e mascaramento das realidades nacionais. A utilização da seleção de futebol de um país como um forte símbolo nacionalista não é uma novidade como também não é nova a relação entre política, governos e futebol. O que não faltam são exemplos de governos pegando carona em campanhas de sucessos de seleções em Copas do Mundo. Foi assim que aconteceu com o Brasil em 1970, ao passo que dentro de campo no México os jogadores brasileiros encantavam, e em seu próprio país os seus conterrâneos sofriam com vigilância e torturas, dores, mortes nos porões da ditadura militar. Mas aproveitando o embalo da campanha da seleção brasileira em plena Copa do Mundo, os televisores, os jornais e os rádios que apoiavam o regime militar anunciavam: "Ninguém segura o Brasil", ao som de:



"Todos juntos vamos

Pra frente, Brasil
Salve a Seleção!"





Na Argentina, após a seleção do país vencer a Copa do mundo de 1978, o general Videla também se utilizou da imagem do sucesso do time em benefício da ditadura.

"O futebol é a pátria, o poder é o futebol: Eu sou a pátria, diziam essas ditaduras militares" trecho retirado do Livro Futebol ao Sol e a Sombra, do escritor uruguaio Eduardo Galeano.

No Brasil a relação entre política e futebol continua sendo utilizada nos tempos de hoje. Muitos políticos utilizam de cargos e carreiras em clubes como trampolim para conquistar espaço na política nacional. Não é a toa que na trágica votação do impeachment de Dilma Rousseff na Câmera dos Deputados em 2016, dentre os comentários machistas utilizados como justificativa também estavam presentes várias dedicatórias aos times e às suas torcidas. Não foram poucos os deputados que utilizaram como justificativa do voto prol impeachment de Dilma, munidos com frases como "pelo time de futebol..." Com o intuito de conseguir conquistar o eleitor pela sua paixão clubística e aproveitando a audiência da transmissão ao vivo pela TV. O pior é que, assim como os deputados, já vi eleitores justificarem seus votos porque tal candidato torcia para tal time e poderia trazer algum benefício ao clube.

Em 2018, o presidente eleito de extrema-direita, Jair Bolsonaro, fez “arminha com a mão” e “atirou’’ para diversas torcidas apelando também para popularidade dos times de futebol e a paixão clubística de seus eleitores. Nas redes sociais o que não faltam são fotografias com o político vestindo camisas de vários clubes do Brasil, incluindo times rivais. Já eleito, aproveitou a premiação do campeonato Brasileiro deste ano, conquistado pelo Palmeiras, e pegou carona na festa alviverde para fazer palanque político participando da cerimônia no gramado, erguendo o troféu e dando a volta olímpica com o time.

Nos tempos de chumbo brasileiros, o futebol também foi utilizado como espaço de resistência e luta por liberdade de expressão por torcidas organizadas, times de futebol, jogadores e movimentos democráticos. Um dos mais conhecidos no Brasil protagonizado por um time de futebol foi o Movimento Democracia Corinthiana, experiência vivenciada entre 1982 e 1984. Em pleno regime militar, época em que a população não tinha o direito de escolher os representantes políticos do país, o time do Corinthians apresentava um modelo de gestão participativa e democrática em que jogadores, funcionários, comissão técnica e diretoria deliberavam, por meio do voto, sobre as mais variadas pautas como contratações, demissões e escalação. Importante destacar que todos os votos tinham o peso igual. O movimento também realizou ações políticas de engajamento na luta pela redemocratização no país. Dentro de campo os jogadores vestiam camisas do clube e mostravam faixas com dizeres contrários à política da época como “eu quero votar para presidente”, “ganhar ou perder, mas sempre com democracia” e “diretas já” . Alguns jogadores como Sócrates, Casagrande e Wladimir participaram inclusive de comícios políticos que pediam as eleições diretas no país.

Muitas torcidas organizadas na época também se posicionaram politicamente durante o período da ditadura. Já que estamos falando de Corinthians, a torcida organizada do time Gaviões da Fiel, por exemplo, antes mesmo do movimento do time já era bastante engajada politicamente nos estádios.

Atualmente, torcidas antifascistas de diversos times de futebol espalhados pelo Brasil têm se organizado em resposta aos ataques racistas, homofóbicos e machistas, propagado em partidas e por torcidas de futebol. Em Pernambuco os três grandes clubes da capital já contam com coletivos de torcedores ativos que defendem as pautas antifascistas. No contexto político brasileiro, muitas dessas torcidas também se posicionaram em defesa da democracia e contra a ameaça fascista representada pela candidatura do presidente eleito de extrema-direita. Consciente dos enormes desafios sociais e políticos que o país enfrenta e enfrentará a partir do próximo ano, desejo que as torcidas antifascistas continuem na luta, cresçam e se multipliquem cada vez mais. Pois futebol e política sempre se misturaram em diversos contextos e épocas e agora não será diferente. Que o futebol seja também um espaço de luta e resistência.

segunda-feira, 6 de agosto de 2018

Ferroviário: um ato de sobrevivência


Foto: Keylla Miranda

Algumas equipes vivem, por mais que suas torcidas neguem, de títulos. Um ano sem gritar "é campeão" é um ano fracassado. Outras de participações em torneios e títulos esporádicos. Podem não ganhar sempre, mas seus torcedores sabem que o ano comecará e terminará com jogos do seu clube. Eles sabem onde encontrá-la, quantos jogos faram no ano, toda sua tabela e perspectivas. Porém algumas equipes apenas sobrevivem. E ver seu time lutando apenas para sobreviver é o que pior pode acontecer para um torcedor. 

Imagine você acompanhando alguém que ama apenas sobrevivendo, quase vegetando, olhar para a pessoa, saber de tudo (ou muito) do que ela viveu, ainda ver um certo brilho no seu olhar. Mas apenas isso. Ela apenas sobrevive. Ela não te faz mais sorrir, ter raiva, se emocionar. Ela apenas está lá. E foi isso que a torcida do Ferroviário viveu nos últimos anos, viu apenas seu time sobreviver. 

Enquanto antigos rivais caiam, subiam, ganhavam títulos, ficavam encalhados na série C. O Ferroviário apenas sobreviveu, dava alguns sinais vitais por 3 meses a cada ano para disputar uma decadente série B do cearense, contra equipes semi-amadoras. E a cada fracasso, a impressão para a torcida é que esses 3 meses eram apenas “a melhora da morte”. O medo era em algum momento receber a notícia que “o Ferroviário não disputará torneios profissionais este ano”, tamanha a crise que se deu sobre à Barra do Ceará. 

O resgate, com um acesso mais a base da incompetência e amadorismo alheio, trouxe um pouco de esperança. Porém, ainda era necessário ir além do “existir”. O time precisava de calendário, precisava competir e não viver apenas de 3 meses em campo, mesmo que na elite estadual. E conseguiu! Até mais do que esperava, indo além de uma vaga na série D, com vagas na Copa do Nordeste e Copa do Brasil. E assim, com o calendário cheio, o Ferroviário começava talvez em 2018 um maiores anos de sua vida. Onde ele, de fato, sobreviveu. Fez história com uma bela campanha na Copa do Brasil, enfrentou, e bem, equipes da elite nacional. E com brilhantismo conquistou seu primeiro título nacional. 

Após a conquista era comum ver pessoas, principalmente mais velhos, chorando copiosamente. E isso se explica. Eles acompanharam de perto a luta do Ferroviário pela sobrevivência. Eles viram um time sair de um “clássico dasmultidões” (contra o Ceará) tamanho era sua torcida, para minguar numa série B de cearense, sendo atropelado por times de bairro, como o Floresta, ou empresa, como o Uniclinic. Estes torcedores viveram, diariamente, o medo de ver seu time morrer antes deles. O medo real de nunca mais ver uma glória da equipe que tanto ama. De nunca mais se sentir minimamente respeitado. De andar nas ruas com a camisa do seu clube e ouvir, com um fundo de resiliência, “o ferrim ainda existe?”.

O Ferroviário era a síntese da morte, ou luta pela sobrevivência, de times tradicionais como a Tuna Luso, Goiana E.C., América-PE, Alecrim-RN, Ypiranga-BA, etc. Ele foi por muito tempo apenas, romanticamente falando, uma foto manchada de um clube campeão “no século passado” (1995 seu último título). De algo que talvez não fosse existir outra vez. Onde torcedores mais velhos morreriam com medo de não deixar “seu legado” para os mais jovens. Pois, quem vai torcer para um time que apenas sobrevive? O título do Ferroviário também é um título da Tuna, América e demais citados. De clubes que sobrevivem, com torcedores fiéis, que comemoram cada vitória, por mais simples que seja, como se fosse um título. Pois, cada vitória um ato de sobrevivência. 

Foto: Site do Ferroviário 




quarta-feira, 13 de junho de 2018

Teremos vozes femininas na Copa!


Porque é importante a participação feminina em transmissões via rádios e televisões brasileiras em jogos da Copa do Mundo? Porque a competição é realizada desde 1930, mas só agora mulheres terão a oportunidade de narrar um jogo de mundial. Mas e o que vem depois? Essa é a pergunta que o blog Dibradoras (formado só por mulheres) discutiu neste link que vou deixar aqui “Com açúcar e com afeto” e que vale muito a pena dar uma olhada, pois nada melhor que “ouvir” (no caso ler) uma análise feita por vozes femininas sobre o assunto: https://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2018/06/12/pela-1a-vez-copa-tera-narracao-feminina-o-que-vem-depois/

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Futebol, tática e complexidade: Jamais fomos modernos



Acima um trecho do livro “Pep Guardiola: a evolução”. Assim como provavelmente deve ser o livro, a parte citada traz muitas coisas interessantes e verdadeiras, como, por exemplo, que não é simples a compreensão do jogo, que é importante ter humildade e não ter ideias pré-concebidas e principalmente sobre a crítica feita à imprensa pela forma pobre de analisar.

No entanto, dois trechos me chamaram a atenção, por discordar deles. Sem ler o livro por completo, não posso analisar o pensamento de Guardiola como um todo, me apego a esses pontos para falar sobre o impacto que essas ideias têm sobre alguns setores da imprensa e alguns analistas de futebol. E a forma como alguns veem o esporte.

A primeira é: “o futebol contemporâneo alcançou uma elevada complexidade”... 

Sim. Isso é verdade, há toda uma complexidade no futebol atual. No entanto é extremamente pretensioso elevar essa “complexidade” como algo contemporâneo, basicamente vendendo a ideia de que no passado (anos 60, 70...) não existia tal complexidade. Mentira. Existia sim e talvez fosse até pior. 

Essa ideia não é algo que se resume ao futebol, é apenas a reprodução de que o ser contemporâneo é mais evoluído do que o do passado. Ou seja, "somos mais modernos” e “avançados” porque temos mais tecnologia, absorvemos conhecimento e etc do que o sujeito da década de 70. O que não necessariamente é verdade e o livro “jamais fomos modernos” (de Bruno Latour) ajuda a desconstruir. 

No futebol o mesmo vale. Vivemos sim uma época de avanços, principalmente na parte da tecnologia, estatísticas, big data, etc (o livro “Os Números do Jogo” é bem interessante). A figura do analista de desempenho é praticamente necessária em qualquer time. Isso é real. Porém, como disse, a mesma complexidade que existe atualmente com essas novidades, existiu no passado, por exemplo, com a maior importância dada a preparação física no futebol (principalmente a partir da década de 60), lá, o futebol perdeu um pouco do ar mais “amador” e se tornou mais profissional, se começou a privilegiar fatores físicos, se pesquisar e aplicar. 

Porém muitos podem falar. “Sim. Porém o aspecto físico atualmente é amplamente abordado e incluso no futebol”. Verdade. Muitas vezes com a ajuda da tecnologia atual e, principalmente, com ideias dos vanguardistas das décadas anteriores. E vendo por esse lado, se torna bem mais complexo entender a importância da preparação física no futebol no passado, quando isso era mais ignorado, do que atualmente. Ou seja, para eles era bem mais complexo e difícil entender essa parte do jogo. E como aplicá-la.

Citei apenas um exemplo, o da preparação física, mas poderia citar outros como questões relativas a logística de jogo (que influi), gramado, alimentação, etc. E, principalmente a tática. Assim como houveram mudanças táticas da década de 90 para agora, talvez bem mais complexos foram os avanços da década de 30 para 50 e de 70 para 80, etc. Sempre houve “evolução” e com isso complexidade. Não é uma singularidade nossa. A mesma “elevada complexidade” que temos atualmente, existiu quando foi criado o WM (talvez a tática que por mais tempo perdurou), passando por 4-2-4, 4-3-3, 3-5-2, etc. Cada uma com sua importância histórica. São táticas, eram estudadas, apenas “criamos” (ou reaproveitamos algo) a nossa tática (o livro A pirâmide invertida: A história da tática no futebol). Não elevamos nada. E, talvez, nem revolucionamos. 

O segundo ponto que discordo é: “Se não se faz um mínimo esforço para entender o jogo, as análises acabam sendo desalentadoramente supérfluas, recorrendo-se a aspectos totalmente alheios ao próprio jogo”.

A frase é correta. Porém, não necessariamente discordando do autor, mas sim da interpretação que muitos analistas (e "entendedores de tática") fazem desse tipo de ideia, discordo de quando ele fala sobre os “aspectos alheios ao próprio jogo”. 

A frase é até paradoxa para a forma que muitos dos “modernos analistas" veem (ou dizem) o jogo. Porque eles tentam explicar algo complexo, se baseando “apenas” na tática. Dão muitas vezes uma importância muito maior do que a mesma merece. É como se eles monopolizassem o entendimento da tática e a transformassem na matéria praticamente única do futebol, ignorando, vejam só, aspectos totalmente alheios ao jogo que são extremamente importantes.

E que aspectos são esses? Entre outras coisas, aspectos humanos. Se o jogador está “bem de cabeça” ou não. Por exemplo, se ele tiver com algum problema de ordem pessoal invariavelmente isso atrapalhará no seu desempenho profissional, pode ter o melhor treinador (taticamente falando) do mundo que ele dificilmente tirará muito dele. Por isso, inclusive, é muito comum técnicos com qualidade tática não irem muito longe na carreira porque basicamente não possuem a qualidade (e é importante) para gerir grupos. E sim, isso é necessário. Um treinador de futebol não pode se resumir ao “tático”, ele trabalha com humanos, um grupo com várias personalidades diferentes, faz parte da sua obrigação ser um bom gestor. 

Em resumo, como disse, um pensamento mais aprofundado do futebol é sempre importante e necessário. Na verdade em qualquer aspecto da vida. Porém, tentar passar a ideia (que talvez não seja a de Guardiola mas é a de muitos) de que vivemos uma época que é “mais difícil entender o futebol” que somos mais modernos e etc, e não apenas fruto das nossas singularidades, assim como foi na década de 60..70..80, é prepotência pura. Não, um esporte com mais de 100 anos de existência não se tornou mais complexo e difícil apenas porque é o momento que você vive e, talvez, você se ache mais “evoluído”.