quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

O futebol como bandeira política



Falar que “política e futebol não devem se misturar” está ganhando mais visibilidade atualmente, mas na verdade esses dois já estão juntos há muito tempo e não dá mais para ignorar. Ao longo dos anos, diversos movimentos surgidos no futebol focados na luta por liberdade de expressão e resistência se espalharam em vários lugares pelo mundo, assim também como o uso do futebol por governantes com fins de propaganda política e mascaramento das realidades nacionais. A utilização da seleção de futebol de um país como um forte símbolo nacionalista não é uma novidade como também não é nova a relação entre política, governos e futebol. O que não faltam são exemplos de governos pegando carona em campanhas de sucessos de seleções em Copas do Mundo. Foi assim que aconteceu com o Brasil em 1970, ao passo que dentro de campo no México os jogadores brasileiros encantavam, e em seu próprio país os seus conterrâneos sofriam com vigilância e torturas, dores, mortes nos porões da ditadura militar. Mas aproveitando o embalo da campanha da seleção brasileira em plena Copa do Mundo, os televisores, os jornais e os rádios que apoiavam o regime militar anunciavam: "Ninguém segura o Brasil", ao som de:



"Todos juntos vamos

Pra frente, Brasil
Salve a Seleção!"





Na Argentina, após a seleção do país vencer a Copa do mundo de 1978, o general Videla também se utilizou da imagem do sucesso do time em benefício da ditadura.

"O futebol é a pátria, o poder é o futebol: Eu sou a pátria, diziam essas ditaduras militares" trecho retirado do Livro Futebol ao Sol e a Sombra, do escritor uruguaio Eduardo Galeano.

No Brasil a relação entre política e futebol continua sendo utilizada nos tempos de hoje. Muitos políticos utilizam de cargos e carreiras em clubes como trampolim para conquistar espaço na política nacional. Não é a toa que na trágica votação do impeachment de Dilma Rousseff na Câmera dos Deputados em 2016, dentre os comentários machistas utilizados como justificativa também estavam presentes várias dedicatórias aos times e às suas torcidas. Não foram poucos os deputados que utilizaram como justificativa do voto prol impeachment de Dilma, munidos com frases como "pelo time de futebol..." Com o intuito de conseguir conquistar o eleitor pela sua paixão clubística e aproveitando a audiência da transmissão ao vivo pela TV. O pior é que, assim como os deputados, já vi eleitores justificarem seus votos porque tal candidato torcia para tal time e poderia trazer algum benefício ao clube.

Em 2018, o presidente eleito de extrema-direita, Jair Bolsonaro, fez “arminha com a mão” e “atirou’’ para diversas torcidas apelando também para popularidade dos times de futebol e a paixão clubística de seus eleitores. Nas redes sociais o que não faltam são fotografias com o político vestindo camisas de vários clubes do Brasil, incluindo times rivais. Já eleito, aproveitou a premiação do campeonato Brasileiro deste ano, conquistado pelo Palmeiras, e pegou carona na festa alviverde para fazer palanque político participando da cerimônia no gramado, erguendo o troféu e dando a volta olímpica com o time.

Nos tempos de chumbo brasileiros, o futebol também foi utilizado como espaço de resistência e luta por liberdade de expressão por torcidas organizadas, times de futebol, jogadores e movimentos democráticos. Um dos mais conhecidos no Brasil protagonizado por um time de futebol foi o Movimento Democracia Corinthiana, experiência vivenciada entre 1982 e 1984. Em pleno regime militar, época em que a população não tinha o direito de escolher os representantes políticos do país, o time do Corinthians apresentava um modelo de gestão participativa e democrática em que jogadores, funcionários, comissão técnica e diretoria deliberavam, por meio do voto, sobre as mais variadas pautas como contratações, demissões e escalação. Importante destacar que todos os votos tinham o peso igual. O movimento também realizou ações políticas de engajamento na luta pela redemocratização no país. Dentro de campo os jogadores vestiam camisas do clube e mostravam faixas com dizeres contrários à política da época como “eu quero votar para presidente”, “ganhar ou perder, mas sempre com democracia” e “diretas já” . Alguns jogadores como Sócrates, Casagrande e Wladimir participaram inclusive de comícios políticos que pediam as eleições diretas no país.

Muitas torcidas organizadas na época também se posicionaram politicamente durante o período da ditadura. Já que estamos falando de Corinthians, a torcida organizada do time Gaviões da Fiel, por exemplo, antes mesmo do movimento do time já era bastante engajada politicamente nos estádios.

Atualmente, torcidas antifascistas de diversos times de futebol espalhados pelo Brasil têm se organizado em resposta aos ataques racistas, homofóbicos e machistas, propagado em partidas e por torcidas de futebol. Em Pernambuco os três grandes clubes da capital já contam com coletivos de torcedores ativos que defendem as pautas antifascistas. No contexto político brasileiro, muitas dessas torcidas também se posicionaram em defesa da democracia e contra a ameaça fascista representada pela candidatura do presidente eleito de extrema-direita. Consciente dos enormes desafios sociais e políticos que o país enfrenta e enfrentará a partir do próximo ano, desejo que as torcidas antifascistas continuem na luta, cresçam e se multipliquem cada vez mais. Pois futebol e política sempre se misturaram em diversos contextos e épocas e agora não será diferente. Que o futebol seja também um espaço de luta e resistência.

segunda-feira, 6 de agosto de 2018

Ferroviário: um ato de sobrevivência


Foto: Keylla Miranda

Algumas equipes vivem, por mais que suas torcidas neguem, de títulos. Um ano sem gritar "é campeão" é um ano fracassado. Outras de participações em torneios e títulos esporádicos. Podem não ganhar sempre, mas seus torcedores sabem que o ano comecará e terminará com jogos do seu clube. Eles sabem onde encontrá-la, quantos jogos faram no ano, toda sua tabela e perspectivas. Porém algumas equipes apenas sobrevivem. E ver seu time lutando apenas para sobreviver é o que pior pode acontecer para um torcedor. 

Imagine você acompanhando alguém que ama apenas sobrevivendo, quase vegetando, olhar para a pessoa, saber de tudo (ou muito) do que ela viveu, ainda ver um certo brilho no seu olhar. Mas apenas isso. Ela apenas sobrevive. Ela não te faz mais sorrir, ter raiva, se emocionar. Ela apenas está lá. E foi isso que a torcida do Ferroviário viveu nos últimos anos, viu apenas seu time sobreviver. 

Enquanto antigos rivais caiam, subiam, ganhavam títulos, ficavam encalhados na série C. O Ferroviário apenas sobreviveu, dava alguns sinais vitais por 3 meses a cada ano para disputar uma decadente série B do cearense, contra equipes semi-amadoras. E a cada fracasso, a impressão para a torcida é que esses 3 meses eram apenas “a melhora da morte”. O medo era em algum momento receber a notícia que “o Ferroviário não disputará torneios profissionais este ano”, tamanha a crise que se deu sobre à Barra do Ceará. 

O resgate, com um acesso mais a base da incompetência e amadorismo alheio, trouxe um pouco de esperança. Porém, ainda era necessário ir além do “existir”. O time precisava de calendário, precisava competir e não viver apenas de 3 meses em campo, mesmo que na elite estadual. E conseguiu! Até mais do que esperava, indo além de uma vaga na série D, com vagas na Copa do Nordeste e Copa do Brasil. E assim, com o calendário cheio, o Ferroviário começava talvez em 2018 um maiores anos de sua vida. Onde ele, de fato, sobreviveu. Fez história com uma bela campanha na Copa do Brasil, enfrentou, e bem, equipes da elite nacional. E com brilhantismo conquistou seu primeiro título nacional. 

Após a conquista era comum ver pessoas, principalmente mais velhos, chorando copiosamente. E isso se explica. Eles acompanharam de perto a luta do Ferroviário pela sobrevivência. Eles viram um time sair de um “clássico dasmultidões” (contra o Ceará) tamanho era sua torcida, para minguar numa série B de cearense, sendo atropelado por times de bairro, como o Floresta, ou empresa, como o Uniclinic. Estes torcedores viveram, diariamente, o medo de ver seu time morrer antes deles. O medo real de nunca mais ver uma glória da equipe que tanto ama. De nunca mais se sentir minimamente respeitado. De andar nas ruas com a camisa do seu clube e ouvir, com um fundo de resiliência, “o ferrim ainda existe?”.

O Ferroviário era a síntese da morte, ou luta pela sobrevivência, de times tradicionais como a Tuna Luso, Goiana E.C., América-PE, Alecrim-RN, Ypiranga-BA, etc. Ele foi por muito tempo apenas, romanticamente falando, uma foto manchada de um clube campeão “no século passado” (1995 seu último título). De algo que talvez não fosse existir outra vez. Onde torcedores mais velhos morreriam com medo de não deixar “seu legado” para os mais jovens. Pois, quem vai torcer para um time que apenas sobrevive? O título do Ferroviário também é um título da Tuna, América e demais citados. De clubes que sobrevivem, com torcedores fiéis, que comemoram cada vitória, por mais simples que seja, como se fosse um título. Pois, cada vitória um ato de sobrevivência. 

Foto: Site do Ferroviário 




quarta-feira, 13 de junho de 2018

Teremos vozes femininas na Copa!


Porque é importante a participação feminina em transmissões via rádios e televisões brasileiras em jogos da Copa do Mundo? Porque a competição é realizada desde 1930, mas só agora mulheres terão a oportunidade de narrar um jogo de mundial. Mas e o que vem depois? Essa é a pergunta que o blog Dibradoras (formado só por mulheres) discutiu neste link que vou deixar aqui “Com açúcar e com afeto” e que vale muito a pena dar uma olhada, pois nada melhor que “ouvir” (no caso ler) uma análise feita por vozes femininas sobre o assunto: https://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2018/06/12/pela-1a-vez-copa-tera-narracao-feminina-o-que-vem-depois/