Acho que seria repetitivo em falar sobre o desejo de boa parte dos jovens brasileiros em se tornar jogador de futebol. O foco do texto não é esse e sim falar dos que conseguem ou chegam bem próximo, porém, fracassam. Para isso, usarei como base um exemplo que ao meu ver pode ser estendido a diversos outros casos bem parecidos.Muito se fala sobre a utilização das categorias de base no futebol brasileiro. Porém, no geral, de uma ou outra maneira o foco sempre estará voltado para o resultado final: o jogador profissional do clube. E não para o que fica no meio: a pessoa e sua carreira. Ou seja, a ênfase será maior, nas melhores formas ou maneiras de um time aproveitar jovens da base no seu elenco principal e consequentemente lucrar com eles, com isso acabam esquecendo dos milhares e milhares de jogadores que basicamente iram fracassar. Em resumo, ao meu ver, boa parte dos clubes não se preocupam em ensinar aos jovens que, em sua maioria, eles não irão conseguir o que planejaram pra si, ser um jogador famoso. No entanto, isso não os tornará pessoas piores e muito menos significa que não podem ter uma carreira, mesmo no futebol, digna.
Dentro disso tudo há algo fundamental na construção desses jovens e que muitas vezes segue, de forma equivocada ao meu ver, a mesma metodologia. A psicologia nas categorias de base. No final do texto indicarei alguns artigos que reforçam esse pensamento. Porém, começarei com foco a um (clique aqui pra ver completo)
“Não são poucos os casos de jogadores que se destacam nas categorias de base, mas que quando incorporados aos plantéis profissionais não conseguem manter o mesmo nível de desempenho ou mesmo acabam abandonando a modalidade.
Dificuldades de
adaptação? Aumento do nível de exigência? Mudança de foco?
Provavelmente, todos estes fatores e mais alguns. Não é possível
afirmar que a cobrança e expectativa por resultados seja diferente
nas categorias de base e no profissional. Mas é relativamente fácil
de observar que a exposição pública do jogador aumenta. E muito.
Até existe cobertura de mídia nas categorias de base, mas nada
comparado ao que ocorre nas equipes profissionais”.
O artigo, que é bom, fala sobre questões importantes de o porquê determinados jogadores não conseguem chegar ao sucesso. Porém, mais uma vez, ele trata do produto final baseado no sucesso “o jogador que era destaque” e não necessariamente no básico, de do que é composta a maioria da base, “o jogador que é mais ou menos”. Os elencos das categorias inferiores são compostos por, digamos, 50 jogadores, entre sub-17 e sub-20, desses, no máximo e na média, sendo bem positivo, 10 conseguiram sucesso no futebol. E quando falo de sucesso é jogar uma Série B ou A. Os demais irão rodar por times pequenos, série B/C ou até D de estaduais e provavelmente não irão se sustentar apenas do futebol. E a grande maioria nem irá seguir na carreira.
Para isso é importante destacar esse levantamento da CBF que diz que: Mais de 80% dos jogadores no Brasil ganham menos de R$ 1 mil de salário (clique nas imagens abaixo para ir para os textos).
Em resumo, essa introdução serve para destacar que, na base, uma minoria “tem talento” ou se destaca a ponto de se tornar um profissional que se sustente através do futebol. A maioria vai, basicamente e sendo bem direto: fracassar. E aí voltamos ao ponto central do texto: Se as categorias de base dos clubes realmente se preocupam com o ser humano que irá fracassar em seu sonho de ser um grande jogador de futebol "famoso".
A história de
um jogador – Como disse, usarei um exemplo como recorte que, ao meu
ver, engloba diversos e diversos jogadores. E ele é o
do jovem que aos 14, 15 anos deixa sua cidade (no interior
principalmente) para tentar a “sorte” de ser jogador profissional
de um grande time (um exemplo aqui), que, na maioria das vezes são
os que oferecem estrutura de base a jogadores. Ou seja, nesse momento
ele passa a optar e entregar boa parte do seu futuro a um objetivo: ser jogador profissional. Muitos clubes (exemplo), como deve ser,
oferecem toda a assistência, estudantil, médica, etc ao atleta. No
entanto, por mais importante que seja, não há como negar que o foco
do rapaz, pelo menos até os 18...19 anos, será ser jogador de
futebol, sua rotina será de treinos, competições, alojamento, etc. Ele será apenas preparado para aquilo. E vale lembrar que diferente de outras profissões o futebol se
resume a ele mesmo. Exemplo, se um jovem sai de casa para estudar
engenharia em outra cidade, mesmo que não se torne um engenheiro de
sucesso, ele, na pior das hipóteses terá um diploma, uma capacitação
que o destacará em meio a pessoas que não o tenham. É um
diferencial. Porém “se formar” jogador de futebol servirá
apenas para ser jogador de futebol. No “mundo real” isso não é
diferencial de nada, no máximo, se não tiver futuro
profissionalmente, ele ganhará uns 50 reais em algum torneio amador
que participe.
Mas voltando à
história. Como digo na introdução, a
maioria da base é composta por jogadores medianos, e esse jovem pode
ser um desses. Chega ao clube, treina, fica no banco na maioria dos
jogos do sub-17... estoura a idade, continua no banco no time
sub-20...e encerra a carreira no juvenil. E aí? O que realmente foi feito
do (ou para) o rapaz? O clube realmente se preocupou na “formação
da pessoa dentro do seu objetivo” ou apenas na “formação de um
atleta de elite que sirva ao próprio clube”. E e isso não se resume apenas na
formação “moral” (como pessoa) de um jogador. E sim, na sensibilidade de dar
a ele a oportunidade de uma formação profissional dentro do
futebol, todavia, deixando claro que a chance dele ser “medíocre”
(mediano) é grande.
Boa parte dos
clubes, e aí muitas vezes por questões de empresários (outro fator
que merece um texto a parte) ou interesses internos, basicamente
prendem até onde podem os jogadores para depois simplesmente
dispensá-los. E usando o exemplo citado anteriormente de forma
prática, imagine esse jovem, sai do interior, etc... etc... ele basicamente construiu toda sua carreira juvenil em ser reserva ou ser
titular com pouco destaque, com 20 anos, sem espaço na base e muito
menos no time profissional ele é liberado/dispensado para “buscar novos
times". Porém, como conseguir novos times, mesmo sendo pequeno, se você não tem o mínimo de portfólio (até conseguir
empresário fica difícil), pouco se acompanha a base e os
empresários que acompanham vão sempre buscar “os destaques”
(que, inclusive, muitas vezes flopam o texto acima – esse – é
ótimo sobre isso), porém poucos se importam com o “carregador de
piano” ou o jogador “comum” que poderia muito bem, até porque a maioria dos jogadores em geral são “comuns” (é uma questão de
oportunidade) conseguir um certo destaque em times menores e ter uma
carreira minimamente digna. Ao fim o clube lhe nega isso apenas o
tratando como um “objeto de uso futuro” que na maioria das vezes
não irá usar. É a mercantilização de um sonho, de um objetivo.
Em resumo, os
clubes formadores não se preocupam em formar jogadores medianos para
outros clubes menores. A preocupação e foco, em geral, é formar
jogadores para uso interno e descartar no momento que tenha interesse.
Porém, como falado anteriormente, 80% dos jogadores estão
encaixados no primeiro exemplo, e deles, boa parte se perde. Seria mais ou menos como se você
tivesse uma escola em que a preocupação fosse de formar 10 pessoas,
sei lá... em medicina. E as demais, bem, que se virem. Não lhe é
dado mercado. Imagine se você é estudante de arquitetura e consegue um estágio onde você trabalha apenas “como
estagiário” não tem qualquer aproximação com o trabalho
profissional, dia-dia, etc. Que tipo de profissional você será?
Que estrutura lhe darão para ir ao mercado? O mesmo vale para esses jogadores, e de forma até mais cruel porque, como falei anteriormente, o futebol se resume a ele mesmo.
Muitas vezes as categorias de base se restringem apenas a fazer uma grande peneira onde os melhores passam e os medianos que se virem depois, sendo que você, como clube, ocupou 4...5 anos fundamentais da vida do jogador/pessoa. E repito, dar estrutura de alimentação, saúde e mesmo escola é o mínimo que o clube deve fazer. A questão aqui é dar a “estrutura profissional” para ele de seguir uma carreira, pelo menos mediana dentro do que foi preparado por anos.
E o que deveria
ser feito? Ao meu ver, ter como objetivo central formar jogadores por formar, para os outros clubes utilizarem,
sem o interesse real em “fazer dinheiro” com ele. Até porque essa será a realidade da maioria. É claro que existem as estrelas na base e esse terão um “tratamento especial” (que muitas vezes mais atrapalha do que ajuda). E é óbvio
que os clubes também podem lucrar com a base. Porém, sem esquecer
que estão trabalhando com pessoas e a maioria ali não irá “muito
longe” e que deve-se saber trabalhar isso, deixar claro que o fracasso será natural a grande maioria.
Se o jogador com
18, 19 anos ainda não subiu e joga ativamente no profissional é porque provavelmente ele não é um "diferenciado", então, empresta
pra time menor. Dê a oportunidade a ele de construir uma carreira. Por exemplo, ele pode sair de um São Paulo, onde não teria espaço, para jogar a série A3 no
Taboão da Serra. Porém, estará jogando, se, como acontece com a
maioria, não “der certo” no time grande ele terá minimamente tem a oportunidade
de construir uma carreira profissional em times menores, em
“arriscar”. Vai que ele faz uma boa temporada num time da A3 e é
contratado para jogar uma série B, C... já subirá de patamar.
Até porque, repito, a maioria dos jogares são medianos. É bem
possível que um jogador que é reserva do Boa Esporte (que disputa a
série B) e ganhe, sei lá, 6 mil reais, seja do mesmo nível de um
jogador que joga a 4° divisão de São Paulo pelo XV de Jáu e
recebe 1 mil. É tudo apenas uma questão de oportunidades, formar
portfólio, ter seu momento, motivação, etc. E a partir do ponto em que um clube com estrutura, que já tem um nome no mercado “prende” seu jogador na base (como estagiário) ele tira dele
essa oportunidade.
O que acontece é que muitas vezes um jogador que seria mediano, no entanto, teve uma
estrutura de base, perca espaço para outro mediano sem estrutura e que subiu “de qualquer jeito” em um time menor. E isso cria
um círculo vicioso que acaba sendo ruim pra ambos. É ruim porque o
jogador de base formado “sem estrutura” normalmente já tinha
outros objetivos, outra construção e mentalidade, talvez até mais
conformista, o que leva a uma diminuição de seu potencial de
formação. Resumindo ele não foi "moldado" para ser jogador de futebol, ele tinha talento, se fosse, beleza, se não, tudo bem também (existem, óbvio, exceções). Já o atleta (de time grande) é formado “para ser atleta”
é estruturado para aquilo, porém, muitas vezes, acaba ficando
“preso” ao circulo que falei anteriormente, ou seja, a categoria de base. Isso frustra. Causa decepção. Diminui sua potencialidade. Nesse caso ele foi "moldado" para dar certo, mas, como na maioria das vezes, e se não der?
Até porque,
usando o exemplo anterior, imagine você saindo cedo de casa com o sonho de ser profissional, sendo acompanhando a distância
pelos seus pais/família que provavelmente esperam que seu filho jogue num time grande, e aí passa um ano e você na base,
passa outro e você continua lá, faz um treino esporádico com o
time profissional mas, não sai da base, enquanto isso talvez algum
companheiro seu já tenha subido (o que causa frustração) e no
final de tudo você “volta pra casa” (pra família) dizendo que
não conseguiu jogar no profissional e vai procurar outro time
(menor). O abalo que isso causa na sua família e consequentemente em
você é alto, principalmente se não tiver uma estrutura que lhe indique, desde cedo que você vai/pode fracassar (A maioria fracassa, a probabilidade disso acontecer é maior). Isso pode
fazer com que alguém que poderia ser um jogador mediano de clubes
medianos, se torne uma pessoa frustrada (e aí abala a formação
humana mesmo).
Finalizando e como “considerações finais” é que os clubes formadores
devem saber que seu principal papel é: Formar jogadores para outros times. Que eles não
irão ter lucro com a grande maioria, mas, a partir do momento em que trabalham
com jovens devem ter na mente que possuem essa responsabilidade de dar a
oportunidade de formação profissional (média) a todos. A responsabilidade de, repito,
fazer a base para que outros (times), de menor poder aquisitivo,
utilizem.
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Alguns artigos sobre psicologia na base:
Futebol: O papel importante das categorias de base


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